Mais de 300 trabalhadores da Rede Cuca em Fortaleza ficam sem direitos trabalhistas: a farra das “Organizações Sociais” com o dinheiro público

Trabalhadores foram demitidos em Fortaleza e estão há mais de um mês sem receber seus direitos. 😡 Tudo por causa do modelo das Organizações Sociais (OS) — empresas privadas que recebem milhões em dinheiro público para gerir serviços como saúde, cultura e esporte. Na teoria, seriam mais “eficientes”. Na prática? Menos transparência, apadrinhamento político e precarização do trabalho.

SAULO CORLEONEPOLÍTICAECONOMIACULTURA

8/18/20255 min ler

Cerca de 300 trabalhadores foram demitidos dos Centros Urbanos de Cultura, Arte, Ciência e Esporte de Fortaleza e estão há mais de um mês sem receber o que é de direito. O modelo privatista das OS mais uma vez deixa a conta para o povo pagar.

Enquanto a juventude periférica perde acesso a cultura, esporte e educação, e os trabalhadores ficam sem salário, a Prefeitura de Fortaleza e suas “Organizações Sociais” (OS) mostram como o capitalismo brasileiro sabe terceirizar a culpa e socializar o prejuízo.

No dia 30 de junho de 2025, cerca de 300 profissionais foram demitidos dos cinco equipamentos da Rede Cuca (Mondubim, Jangurussu, José Walter, Barra do Ceará e Pici). A gestão passou do Instituto Cuca (IC) para o Instituto Juventude pela Vida (Ivida), mas o que sobrou para os trabalhadores foi o calote: direitos trabalhistas atrasados, multas rescisórias não pagas e promessas de recontratação que não se cumpriram.

A desculpa do IC? “Não tem verba”. Ou seja, usaram o dinheiro que deveria garantir salários e rescisões em “outras áreas”, segundo a própria Prefeitura. Resultado: pais e mães de família sem condições de pagar água, luz e comida — enquanto a dívida, com juros, cresce.

O que é uma OS e por que o povo sempre perde?
O modelo da Organização Social é um modelo privatista de gestão, Uma OS é uma entidade de direito privado, sem fins lucrativos, qualificada pelo poder público para gerir serviços de interesse público, como saúde, educação, cultura e pesquisa científica. Essa qualificação permite que a OS celebre um contrato de gestão com o governo, estabelecendo metas e indicadores de desempenho para a execução dos serviços. O Estado repassa milhões de reais para essas entidades privadas “sem fins lucrativos” (mas com muito lucro indireto para seus gestores), que teoricamente teriam mais “agilidade” para contratar e administrar recursos. Na realidade a coisa é bem diferente.


Como funciona na prática:

  • Privatiza a gestão, mas mantém dinheiro público;

  • Foge da Lei de Licitações e reduz transparência;

  • Garante lucros e cargos para aliados políticos;

  • Quando o contrato acaba, o trabalhador leva calote e o Estado diz “não é comigo”.

É a velha história: lucros para poucos, prejuízos para muitos.

O drama dos trabalhadores
Um ex-funcionário que trabalhou no Cuca por mais de 10 anos contou que juntava dinheiro para comprar um carro, mas precisou adiar o sonho:

“Meu sonho tá indo embora. Meu filho casou e não pude dar o presente. É humilhante.”

A negociação com a Prefeitura, mediada pela Procuradoria Geral do Município, está emperrada. O medo é que a Prefeitura estique a conversa até quebrar a mobilização e ainda tente parcelar ou cortar os direitos — até mesmo a multa de 40% prevista na CLT.

No capitalismo brasileiro, terceirização é sinônimo de precarização. E no caso das OS, é precarização com dinheiro público. Ouça o relato de um trabalhador sobre o período de troca de gestão nas últimas eleições para a prefeitura:

A Rede Cuca funciona como uma rede de equipamentos públicos, localizados em bairros da periferia, garantindo acesso a cultura, esportes, cursos e formações para os jovens de Fortaleza que mais precisam. Esse modelo de gestão impede o funcionamento efetivo da Rede, deixando a política pública a mercê do prefeito da ocasião e ao seu grupo político. Participei como monitor de audiovisual no Cuca da Barra do Ceará através de um edital do Programa Futuros, que seleciona jovens para atuar como monitores em diversas áreas, como na biblioteca, na rádio Cuca, no audiovisual, no setor de Direitos Humanos e tantos outros setores. Os jovens ganhavam bolsas de 600 reais por mês para atuar durante 9 meses, com a carga horária de 16h por semana. No final cada equipe de cada setor dos Cucas entrega um projeto específico. A equipe que fiz parte entregou um filme de comédia romântica que narra um romance entre duas mulheres na Barra do Ceará.

Foi uma ótima experiência vivenciar todo o trabalho de roteirização, captação de imagens e áudio, elaborar uma trilha exclusiva para o filme com a ajuda de várias pessoas da equipe da Rede Cuca. Infelizmente boa parte deles hoje estão demitidos e sem os direitos trabalhistas e muitos inclusive estão desempregados. Eles fazem parte dessa história da Rede Cuca e são parte essencial da política pública. Achar que uma empresa vai gerir melhor uma políica pública do que o próprio Estado ou de uma organização coletiva dos prórpios trabalhadores é conversa fiada de liberal. Quem toca os projetos e mantém a Rede Cuca viva são os trabalhadores, a juventude de Fortaleza e as famílias. É importante resgatar a Rede Cuca para o controle estatal para fazer um melhor uso de recursos públicos.

Alguns trabalhadores relatam discussões acaloradas com o atual secretário de Juventude da Prefeitura de Fortaleza, Júlio Brizzi (PT) e algumas ameaças. O prefeito de Fortaleza Evandro Leitão (PT) está se esquivando das negociações e coloca a culpa na gestão anterior, a do ex-prefeito José Sarto (PDT). Evandro alega que a última gestão deixou um rombo nos cofres públicos e muitas dívidas que estão próximas de vencer.

"Não houve reunião geral nem pra darem satisfação sobre as demissões. A notícia de que aconteceria as demissões chegou em maio por coordenadores de cada área, semanas depois de começarem os boatos e burburinhos. Aí aconteceu de fato em junho, mês que inclusive todos os 300 funcionários seguiram trabalhando normalmente mesmo sabendo o que ia acontecer." (ex-funcionária da Rede Cuca).

Há relatos de que o presidente do Instituto Cuca, OS criada para administrar a Rede Cuca, foi orientado a não participar da licitação que prorrogaria a sua gestão, mesmo com a OS apresentando o cumprimento de diversas metas. Houveram algumas movimentações dentro do Instituto Cuca para eleger um presidente que fosse simpático a atual gestão petista, o problema é que o instituto já estava aparelhado pela gestão anterior do PDT e a eleição foi muito acirrada. Provavelmente depois que percebeu que não teria total controle da OS, o atual prefeito deciciu emplacar uma nova OS para concorrer na licitação para administrar a Rede Cuca, com pessoas mais próximas, obtendo total controle da gestão. Alguns trabalhadores relataram que, ao pesquisar o endereço da sede do Instituto Juventude pela Vida (Ivida), não encontram nenhuma fachada indicando que ali seria a sede do Instituto, há apenas uma clínica de saúde. Ao pesquisar no site, há algumas ações pontuais do instituto e fica a pergunta: Essa OS será capaz de gerir e ser eficiente ? Ela tem experiência com contratos milionários.

Na Rede Cuca você encontra um universo de possibilidades, seja na área da Cultura, do Esporte e da Educação. É lamentável uma política pública ficar a mercê de oscilações políticas e ter um modelo privatista de gestão que destrata trabalhadores com o uso de recursos públicos. Retomar o controle estatal significa gerir melhor, com maior autonomia e com mais garantias de direitos aos trabalhadores e aos jovens que usam o equipamento, transformando a Rede Pública em uma Política Pública de Estado e não de governo. OS governos passam, o Estado fica, e as políticas públicas como o Cuca também deveriam ficar!

📢 BolcheNews seguirá cobrando: dinheiro público tem que servir ao povo, e não a empresários disfarçados de “gestores sociais”.